sexta-feira, 7 de maio de 2010

OS SAPOS - MANUEL BANDEIRA

EM 1918, Manuel Bandeira escreveu um poema - OS sapos - fazendo uma crítica aos poetas da geração passada, sobretudo aos parnasianos que primavam pela forma e perfeição.

OS SAPOS
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
_"Meu pai foi à guerra!"
_"Não foi!" _ "Foi!" _"Não foi!".

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz:_ "Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinquenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A formas a forma.

Clame a saparia
em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas...

Urra o sapo -boi:
_ "Meu pai foi rei" _ "Foi!"
_Não foi! _ "Não foi!"

Brada em assomo
O sapo - tanoeiro:
_"A grande arte é como
Lavor de joalheiro

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo."

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
_"Sei!" _ "Não sabe!" _ "Sabe!".

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio..

Os sapos representam os escritores de ideias retrógradas. Quando este poema foi recitado por Ronald Carvalho, na SEMANA DA ARTE MODERNA em 1922, o público vaiou, berrou, relinchou, fez a maior algazarra.
Hoje, pode-se dizer que aconteceu a metamorfose com alguns sapos. Outros, entretanto, continuam na penumbra.

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